terça-feira, 20 de julho de 2010

Por mais dedos verde-amarelos

Janeiro de 2005. Os iraquianos vão às urnas. Marcam seu voto com o indicador melado de tinta roxa, em meio a bombas e granadas, literalmente. Perdem a vida tentando votar. São perseguidos por conta de seus dedos roxos. Ainda assim, exibem-nos às câmeras fotográficas: eu votei. E isso é mais.

Março de 2010. A jovem iraquiana Sunshine (nome fictício por ela escolhido) descreve em seu blog a sua primeira ida às urnas. "Acordei animada e cheia de esperança. Meu coração batia apressado quando entrei na sala." Uma certa frustração por não ver muita gente votando, mas ainda assim o orgulho de exibir, em dois ângulos, sua delicada unha pintada melada de roxo. "Seria ótimo que as pessoas colocassem o interesse da comunidade na frente dos seus próprios interesses, pois não há nada no dia de hoje que seja mais importante do que votar para construir um futuro melhor para nós."

Sunshine tem 18 anos e quer ajudar a reconstruir o seu país. O que querem muitos jovens brasileiros? Eleição é sinônimo de fardo, e o argumento é a velha e cômoda generalização de que nenhum político presta. Sem nem entrar neste mérito, prestando ou não prestando são eles que governam o nosso país. E se existe em nós algum desejo de ajudar a nossa nação, votar é uma das formas. Não abro mão de exercer meu direito e dever de votar e não há político corrupto que possa me roubar este orgulho. Alguém me explique como é que não votar ajuda o país. Digamos que você não votasse, e aí o que? No máximo iria aproveitar o domingão de praia. Nenhum político presta, o mar está uma delícia, votar não adianta nada, vamo marcar de tomar uma com os amigos, parabéns, você faria sua parte, mostraria sua revolta contra a canalhice generalizada que reina no Brasil. Né? E? Enquanto isso pessoas arriscam suas vidas e dariam tudo para ter uma voz.

Brasil, outubro de 2010. Paremos e pensemos. Olhemos em volta, além do nosso mundinho. Não votemos apenas. Melemos nossos dedos. Por nós, por nosso país, e por aqueles que, mundo afora, ainda não podem fazê-lo.


http://livesstrong.blogspot.com/2010/03/i-voted.html

4 comentários:

rosa maria disse...

Bravo! De volta ao blog em grande estilo! Embora que, sem querer ser estraga-prazeres, e mesmo assim botando o dedo no suspiro, não sei se o voto no Iraque vale alguma coisa em relação à reconstrução do país, ou de uma nacionalidade. Temo que seja só para legitimar uma escolha que não foi feita pelos eleitores. Espero estar errada e que Sunshine tenha razão de ficar orgulhosa de seu voto!

Jorge Falcão disse...

Estou com Sunshine e com você, Taci. O voto, mesmo frágil, mesmo comprometido, mesmo arriscando legitimar uma situação não muito legítima, ainda assim VALE, ainda assim é SAGRADO. Não o fosse, por que os radicais de qualquer matiz mostram sempre tanta sofreguidão em o perseguir, o usurpar, o desqualificar, o extinguir? O voto desenha no céu da história de um povo a constelação da vontade da maioria. Vontade que nenhuma ideologia ou religião, que nenhum guia genial dos povos possui de partida, vontade que emerge e reemerge, misteriosa, volátil, soberana, capenga. Viva a vontade popular expressa pelo voto, seja ele qual for, venha de onde vier! Vamos humilde e orgulhosamente votar, como Sunshine, na base de um voto por homem/mulher, pois como diziam os Saltimbancos da canção de Enriquez, Bardotti e Chico, "todos juntos somos fortes/ Somos pedra somos arco/ Todos nós no mesmo barco/ Não há nada pra temer!"

Erick J. R. Silva disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Erick J. R. Silva disse...

Um texto com precisão cirúrgica, Taci!
Votar deve ser um ato que representa um comprometimento com algo maior do que nós mesmos. Infelizmente, estamos longe dessa realidade em nosso país e, sobretudo, em nossa tão sofrida região. Somente com mudança de comportamento (e aí entra nosso papel como formadores de opinião), o cenário atual pode ser modificado.

Nota: sem querer, exclui meu comentário anterior...rsrsrrs