sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Eu ando em frente pra sentir saudade

"Sim... estás precisando de algo? com saudade de algo? Pensa se queres que eu leve alguma coisa daqui e me avisa."

Tenho saudade do sol. Me traz um verão? Sabe daqueles em que você sai sem um casaquinho e nem passa frio? Ah, vai, aposto como você acha um facinho, facinho, por aí. Imagina, quando você chegar, e abrir sua mala, e aquele raio brilhante de sol inundar meu quartinho? As meninas vão estranhar a luz forte escapando pela fresta da porta. Vai ser uma sensação!

Tenho saudade do mar. Manda vir Tamandaré. E deixa vir junto o vendedor de doce japonês, o menino do amendoim, aquela moça simpática das castanhas e um carrinho do picolé caseiro Caicó. Espero que passe na alfândega.

Uma rede. Em uma varanda (deixa que a brisa eu arrumo por aqui).

Tenho saudade da Várzea. E de um tempo que nunca voltará. E de uma casa que já não é mais. E de tantas fases da minha vida em um mesmo lugar. Das minhas andanças pro inglês, pra academia, pra escola, pra universidade, para a parada de ônibus do CFCH. Das minhas andanças. Eu e minha música. E sempre alguém para encontrar nos meus destinos, ao longo dos anos. Passa lá na parada? Vê se tem alguma pulseirinha legal em uma das barraquinhas. E antes de ir embora, pega aquela rua que vai do CTG até a igreja, e compra uma tapioca de queijo e leite condensado (pede pra moça caprichar no leite condensado).

O Marco Zero. Com todos os seus reveillons e carnavais.

Manda vir a sorveteria John's ali da Madalena, e diz pro bigodudo reforçar o estoque de banana caramelada.

Minha coleção de DVDs de Chico. Inteira.

Tenho saudade da Ilha do Retiro. Me traz um lugar na arquibancada, com o sol das três da tarde na cara, pra suar e sofrer, como bom torcedor. Me traz um cazá cazá. Eu respondo Sport, Sport, Sport.

Me traz um pedacinho do que fui. Se couber na mala.

Por enquanto é só, se eu lembrar de mais alguma coisa, te aviso. Valeu mesmo e chega logo! :)

sábado, 1 de agosto de 2009

Lá vem o Brasil, descendo a ladeira?

Algumas verdades a serem levadas em consideração
1. Eu acho que os meios de comunicação têm sim, que denunciar, reclamar e dar voz aos menos favorecidos;
2. Eu acho que os menos favorecidos têm sim direito a uma assistência especial do governo até que se estabeleçam condições justas de partida na disputa pelas oportunidades da vida;
3. Eu não acho que os meios de comunicação devam divulgar reportagens que desprezem a minha capacidade de discernimento.

O objetivo da reportagem especial Das palafitas às ilhas de concreto é criticar o programa habitacional da prefeitura do Recife. Que seja. Mas das duas uma: ou os jornalistas foram extremamente infelizes nas escolhas de seus argumentos, ou trata-se de uma tentativa vazia e sem fundamento de ataque barato ao governo (obs: a questão da estrutura dos prédios é um dos poucos argumentos da reportagem que me pareceu válido).

O fato em questão:
- A prefeitura construiu conjuntos habitacionais e para lá transferiu parte das famílias da comunidade de palafitas Abençoada por Deus.





O que diz a reportagem:
- "Em julho de 2008 a prefeitura transferiu menos da metade das familias para um conjunto habitacional".
Ok, há muito mais a ser feito. Nessa comunidade, nas outras comunidades, nas outras cidades, nos outros países. Mas não seria uma boa coisa o fato de que alguém pelo menos fez uma parte?

Tudo bem, vamos em frente. A reportagem então começa a desfilar alguns absurdos identificados no novo conjunto habitacional:
- "o jogo de dominó é improvisado em cima de tábuas que ficam apoiadas nas pernas dos participantes";
- "não bastasse a disputa entre os pequenos" (pela área para jogar bola), "a turma da terceira idade reivindica igualmente o direito de andar pela pracinha"
- depoimento de uma moradora: "eles (as crianças) precisam gastar energia e não têm um balanço sequer!"
- "das flores e plantas ornamentais presentes no dia da inauguração do residencial, sobraram apenas arbustos secos"
- "disseram que o contrato seria entregue nos primeiros meses da transferência, mas nos jogaram às pressas aqui dentro e ainda não temos nada"
- "o consumo de drogas também é grande. Lógico que lá também existia isso, mas não da mesma forma como aqui dentro"

Peraí, minha gente!! Eu sou uma pessoa extremamente privilegiada nesta vida, e jogava dominó no chão na escola (nem tábua a gente tinha). Nos prédios onde morei, nunca houve playground, e em um deles éramos proibidos de entrar no jardim. Até onde eu saiba, isso nunca virou notícia de jornal nem me causou nenhum trauma psicológico.
Se havia belas plantas na inauguração, por que os moradores não cuidaram delas?
O contrato não foi entregue ainda? Ok, isto está errado, mas já não é bom ter um lugar decente para morar? Se eles estão nas palafitas, reclamam (lógico!), se são transferidos pro apartamento, reclamam que são jogados às pressas (ilógico?)!

O ponto é: tuuudo culpa da prefeitura. As plantas morreram? Culpa da prefeitura. As pessoas estão se drogando mais do que nas palafitas (!?!) ? Culpa da prefeitura. Tem violência e sujeira? Culpa da prefeitura. Pois assim encerra o jornalista: "sempre nos dá um aperto no peito em ver o descaso dos governantes com o povo tão sofrido e massacrado pela vida". Ah, pelamordedeus...

Então, a lógica é: a prefeitura constrói prédios e transfere as pessoas. Aí, as crianças não têm onde brincar (ah, porque lá nas palafitas devia ter uma Disneylândia), as pessoas têm que jogar dominó em tábuas (ah que saudade das salas de jogos das palafitas!), as plantas morrem, as pessoas se drogam mais, ou seja, dá tudo errado. Tudo por causa do descaso dos governantes. Conclusão? A que eu tiro dessa reportagem é: o programa habitacional da prefeitura está fazendo um mal danado à população.

Cá com meus botões, no entanto, eu vos confesso... enquanto as pessoas não tiverem acesso a uma educação que lhes permita cuidar do que recebem, compreender a lógica da coisa e organizarem-se em suas comunidades, não vai ter conjunto habitacional que resolva. Como declarou a própria líder comunitária: "é incrível porque é a própria comunidade que quebra tudo". Preciso dizer mais alguma coisa? Ah, sim, a culpa é do governo.