Às vezes, eu tenho medo de perder a fé. Medo que aqueles que deixam o Brasil porque não há oportunidades, não há condições, não há segurança, não há esperança, me convençam de todos os seus nãos. Medo que aqueles que ficam, mas que só reclamam, porque nada funciona, nada vai pra frente, nada dá certo, nada vale a pena, me convençam de todos os seus nadas. E, juntando os nãos e os nadas que eu vejo e ouço por todos os lados, eu olho pro meu idealzinho, que se encolhe num canto, meio sem resposta, meio sem coragem, quase descrente, mas que ainda me sussurra, um pouco assustado, que há pessoas talentosas, há pessoas que buscam mais do que seu próprio sucesso e seu próprio bem-estar, há pessoas assim que vão ficar, e vão contribuir pra levar o país um pouquinho mais pra frente que seja, cada uma do seu jeito. Como aquela pessoa honesta que se elege e continua honesta; como aquela geração de professores universitários que foi bancada pelo país durante quatro anos para fazer doutorado no exterior e voltou para abrir mais e mais cursos de pós-graduação; como os músicos que criaram orquestras de meninos no interior e em uma das piores favelas do Recife; como o professor que criou um polo de tecnologia no Recife que hoje emprega tantos... A minha fé nestas pessoas, e em mim mesma, é o meu combustível, é o que me leva, é o que me desafia, é o que me inspira. É o que me faz caminhar, votar, brigar, discutir, é o que me faz sorrir. Por isso, eu tenho medo. E se me convencerem de que nada disso adianta?
Há uns meses atrás, uma inglesa radicada em São Paulo veio a Londres e fez uma palestra sobre seu trabalho com educação de crianças surdas. No final, ela contou uma historinha que aprendera no Brasil, sobre o beija-flor que leva água em seu bico para apagar o incêndio da floresta, porque assim se resolvem os grandes problemas, cada um fazendo sua parte. Ou, como cantam Os Saltimbancos, junte um bico com dez unhas, quatro patas, trinta dentes e o valente dos valentes ainda vai te respeitar.
Enquanto eu assistia A orquestra dos meninos, as lágrimas caíam e o medo crescia. O medo de que tudo seja inútil. Mas a história acabou bem - ou melhor ainda, a história não acabou. E por isso meu coração ainda briga para não ser convencido de que é melhor deixar pra lá e dizer ao último que apague a luz ao sair. Pois ainda que eu compartilhe de uma ingênua ilusão, talvez produto de um coração jovem que ainda não se decepcionou o suficiente para desistir, ainda é deste sonho que prefiro viver.
Estou recrutando beija-flores.
Mudamos
Há 3 meses