sexta-feira, 21 de novembro de 2008

I am not the only one

Marjane Sartapi salpicou brilhantemente em quadrinhos a história de sua vida, em "Persepolis". Deliciosa leitura que terminei ontem, já morrendo de saudades. Não tem mais um pouquinho?? Foi como perder uma amiga. Qual não foi, portanto, o brilho que invadiu meus olhos quando ouvi, boquiaberta, a história de uma Marjane 10 anos mais nova, com nome de estrela. Tara é uma iraniana de 23 anos que frequentou em Teerã a mesma universidade que Marjane, no mesmíssimo curso de Artes Plásticas. Como Marji, Tara teve como modelos mulheres totalmente cobertas nas suas aulas de desenho, situação que, como tantas outras passadas sob "o regime", ela chama de "hilárias". Como Marji, Tara viveu a guerra. Ao virar uma mocinha, passou a ser obrigada a cobrir-se toda para sair à rua. No decorrer de sua adolescência, Tara "pirou". Raspou os cabelos bem curtos e passou a ser um menino, integrando gangues de rua. Uma "aventura", segundo ela. Pois ser menina era um fardo pesado demais.
Aos 19 anos, Tara mudou-se para o Cambodja. Lá, ensina crianças a arte da fotografia, enquanto exerce-a também ela mesma. Viver no Cambodja em meio a crianças famintas, mutiladas, vagando por lixões, implorando por comida, fez de Tara outra pessoa. Uma menina que sabe a que ponto a miséria pode chegar, mas que, talvez por isso mesmo, não deixa de se deleitar com cada pequena alegria da vida. Tara sorri como a criança que é. Tara sorri para que suas crianças sorriam com ela.
Muitos de meus conterrâneos estranham e quase repreendem meu desejo de voltar ao Brasil no futuro. Porque aqui, EU posso ter uma vida MUITO melhor. EU posso ganhar MUITO MAIS dinheiro. EU posso estar a salvo da violência que assola meu país. E daí? Eu, eu, eu... A vida já me deu tantas coisas boas, que o que mais quero fazer é partilhá-las.
Quando pessoas como Tara cruzam meu caminho, meu coração se enche da mais profunda admiração e de uma esperança que nos dias de hoje é tão facilmente perdida de vista.
Tara quer dizer estrela.
"You may say I'm a dreamer, but I'm not the only one."

Foto: Tara.

4 comentários:

Jorge Falcão disse...

Eu penso que o melhor lugar para estar é aquele que faça sentido para a criatura. Seja esse lugar o lixão da Muribeca, Londres, São Miguel do Gostoso. A lua e as estrelas, quando surgem no céu, pintam de prata o mundo cá embaixo, mesmo a lama. Semelhantemente, pessoas-estrela como Tara e como Taci, onde estiverem por esse mundo, brilharão e cobrirão de luz o que lhes cerca. Que Deus as guarde e conserve no firmamento do céu, pra que a gente, que nem a criança que aparece nesse post, olhe pra elas e se acalme, e se inspire, e toque a vida.

Chihiro disse...

Primeira vez que eu posto aqui. :)
Então, esse seu post me fez ficar pensando em várias coisas... O senso de propósito e pertencimento que algumas pessoas têm, enquanto outras passam a vida inteira pra descobrir. Também admiro muito a iniciativa de pessoas como Tara e a sua intenção de voltar e trabalhar para o seu país. Com certeza, se mais pessoas fossem assim, não estaríamos na situação que estamos hoje. De qualquer forma, viva os sonhadores! Sem eles esses mundo seria muito chato. ;)

Rosa disse...

Que beleza você resistir à sedução do Hemisfério Norte, mantendo a dedicação ao povo do seu país! O terceiro mundo precisa dos seus nativos, sobretudo daqueles com o nível de conhecimento e consciência que você vem desenvolvendo, para ajudar os demais a chegarem lá. A Europa já levou o suficiente da África, Ásia e América. Chega! Nenhum a menos!

Nathália disse...

Tempo que eu não lia seu blog...
Sempre uma boa leitura! :)
E o teu pai devia mesmo fazer um blog , ou manter a parceria com você.