Quarta-feira de manhã. Meia hora no trem até Rayleigh. Tempo instável, mas a cada vez que as nuvens se dissipam, um azul esplêndido me hipnotiza. Poucas pessoas nas ruas desta cidadezinha suburbana, como em qualquer outra cidadezinha suburbana da Inglaterra. De tão perfeitinhas, as casas parecem de brinquedo. Flores no parapeito das janelas coloridas festejam a primavera. Portões baixos revelam que não há perigo.
Chego à escola para aplicar um teste em uma turma de adolescentes brancos, sem nenhum rastro de minorias étnicas. Na prepotência de seus 14 anos, as meninas carregam bolsas de madame, exibem seus cabelos escovados e olhos pintados, brincam com os celulares e desprezam a professora. Os meninos tiram gracinhas infantis e fazem bagunça.
Quarta-feira à tarde. De volta a Londres, resolvo explorar uma nova rota para o Tai-Chi. Uma caminhada de uma hora cruzando o bairro de Tower Hamlets, um dos mais carentes da cidade. Nos prédios feios, a proximidade das portas e janelas denuncia o minúsculo tamanho dos apartamentos. Um rapazote toca insistentemente a campainha de um centro comunitário em cujo muro está afixado um cartaz justificando o fechamento temporário do lugar devido ao "comportamento inadequado de certos indivíduos". De repente, me deparo com uma mini fazenda, onde vacas e ovelhas pastam em meio a encombros e lixo. No parque, adolescentes correm loucamente atrás de bolas. Uma feira em seus últimos momentos entulha a calçada com mercadorias baratas.
Todo tipo de minoria étnica cruza-se nas ruas, escancarando seus estereótipos. Negras com seus penteados extravagantes e batons vermelhos gargalham e falam alto. Árabes com suas burcas puxam crianças pela mão, em silêncio. Indianos negociam a cada esquina.
Os centros comunitários oferecem cursos, atividades de lazer, livros, computadores, filmes, jogos, na esperança de apaziguar os ânimos dos adolescentes que andam em gangues a esfaquear-se uns aos outros. Os centros vivem cheios, mas os seguranças atentos são apenas mais uma evidência das tensões que pairam no ar. Tensões de habitantes sem raízes, em busca de uma identidade, vivendo em suas ilhotas culturais em uma Londres de desigualdades. Dizem que Londres não é mais Inglaterra. De fato, nesse ritmo, não vai demorar muito para os ingleses virarem uma minoria étnica em sua própria capital.
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