Há os que vêm só pelo calor. Para quem não tem um teto, as poltronas confortáveis em temperatura amena são ideais para um cochilo. Aqui qualquer um pode deixar-se estar e apreciar, da janela, os flocos de neve. Quando o céu abre-se em azul intenso, as temperaturas tornam-se glaciais e a neve cintila e ofusca, antes de derreter-se em lama traiçoeira por todas as calçadas. O inverno é um tempo de poucas opções. Aqui é uma delas.
Há os que chegam com seu material de estudo e espalham-se pelas mesas coletivas. Fogem de lares apinhados de arengas e barulho, ou carregados do silêncio ensurdecedor da solidão. Aqui, há um murmúrio doce e constante, um arrastar de casacos de inverno pendurados no dorso das cadeiras, um vai-vem de folhas de livros. Aqui há vida na medida certa.
Nas manhãs dos dias de semana, os idosos passeiam pelo espaço no seu ritmo, protegidos das perturbações do corre-corre interminável lá de fora, antes que cheguem os adolescentes de capuz ou cílios alongados, a arrastar suas botas molhadas, ávidos pelo acesso à Internet. Nos fins de semana, crianças saltitam com as pilhas de historinhas que vão garantir o seu entretenimento entre quatro paredes e - mal sabem elas - a saúde mental de seus familiares. Aqui acolhe-se a diversidade.
Depois de bater a neve das botas, retomar o fôlego, massagear as extremidades (con)geladas do meu corpo para estimular a circulação do sangue e assoar o nariz que escorre sempre, eu abro a segunda porta e me deixo abraçar pelo calor e cheiro dos livros. Só venho para buscá-los e devolvê-los, mas a vontade é deixar-me ficar sem motivo, contemplando o frio do lado bom da janela, ouvindo o murmúrio da tranquilidade ou o ronco dos sem-teto. Porque aqui, me sinto bem.
domingo, 24 de dezembro de 2017
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