quarta-feira, 28 de julho de 2010

Tic-tac

Tic-tac, tic-tac. Maldito relógio na parede. Hoje não durmo. Detesto barulhos repetitivos. Cinco noites, cinco camas diferentes, vários companheiros de quarto. Tic-tac, tic-tac. A simpática senhora indiana ronca na cama ao lado. When are you getting married, me perguntara ela naquela manhã, assim no meio de uma conversa supérflua, entre um gole e outro de chá, do you think you'll find the right man? Tic-tac. Que raios de pergunta é essa, pensei, sorrindo de volta muito simpática como quem não está nem aí, sou mais eu, que coisa mais besta com que se preocupar. Há tantas outras coisas que me pergunto neste momento. Tic-tac, preciso dormir. Às vezes não queria mais tomar nenhuma decisão. Tic-tac, meu coração parece estar sempre em outro lugar. Tic-tac, tic-tac, do you think you'll find the right man? Os olhos dele me perturbaram naquela noite, indecifráveis, quase assustadores. Fitou-me, I hope you get the job. Talvez tenha sido a última vez que nos vimos. Ele me deu um abraço e pulou na bicicleta, e eu, mais uma vez, virei as costas e prossegui. Como se fosse vê-lo de novo na próxima esquina. Pra que dramatizar? Tic-tac. O sol esteve lindo nesta semana em Londres. Tic-tac, não tenho casa, tenho malas. Pessoas queridas espalhadas pelo mundo. Cinco noites, cinco lugares. Where's your heart, eles perguntaram na entrevista. Meu coração parece estar sempre em outro lugar. Tic-tac, tic-tac, detesto barulhos repetitivos. Tantas perguntas, poucas respostas. Do you think you'll find the right man? Tic.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Por mais dedos verde-amarelos

Janeiro de 2005. Os iraquianos vão às urnas. Marcam seu voto com o indicador melado de tinta roxa, em meio a bombas e granadas, literalmente. Perdem a vida tentando votar. São perseguidos por conta de seus dedos roxos. Ainda assim, exibem-nos às câmeras fotográficas: eu votei. E isso é mais.

Março de 2010. A jovem iraquiana Sunshine (nome fictício por ela escolhido) descreve em seu blog a sua primeira ida às urnas. "Acordei animada e cheia de esperança. Meu coração batia apressado quando entrei na sala." Uma certa frustração por não ver muita gente votando, mas ainda assim o orgulho de exibir, em dois ângulos, sua delicada unha pintada melada de roxo. "Seria ótimo que as pessoas colocassem o interesse da comunidade na frente dos seus próprios interesses, pois não há nada no dia de hoje que seja mais importante do que votar para construir um futuro melhor para nós."

Sunshine tem 18 anos e quer ajudar a reconstruir o seu país. O que querem muitos jovens brasileiros? Eleição é sinônimo de fardo, e o argumento é a velha e cômoda generalização de que nenhum político presta. Sem nem entrar neste mérito, prestando ou não prestando são eles que governam o nosso país. E se existe em nós algum desejo de ajudar a nossa nação, votar é uma das formas. Não abro mão de exercer meu direito e dever de votar e não há político corrupto que possa me roubar este orgulho. Alguém me explique como é que não votar ajuda o país. Digamos que você não votasse, e aí o que? No máximo iria aproveitar o domingão de praia. Nenhum político presta, o mar está uma delícia, votar não adianta nada, vamo marcar de tomar uma com os amigos, parabéns, você faria sua parte, mostraria sua revolta contra a canalhice generalizada que reina no Brasil. Né? E? Enquanto isso pessoas arriscam suas vidas e dariam tudo para ter uma voz.

Brasil, outubro de 2010. Paremos e pensemos. Olhemos em volta, além do nosso mundinho. Não votemos apenas. Melemos nossos dedos. Por nós, por nosso país, e por aqueles que, mundo afora, ainda não podem fazê-lo.


http://livesstrong.blogspot.com/2010/03/i-voted.html